quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

A propósito do Dia Mundial dos Pobres


O Papa Francisco não deixa de nos surpreender com as suas iniciativas e, sobretudo, pela sua forma autêntica de ser, de viver e de transmitir aquilo em que acredita e propõe, antes de mais aos cristãos, mas também a todos os que quiserem acolher os seus desafios. Não tenho dúvidas em afirmar, que este é o Papa certo para o tempo em que vivemos, apesar dos "Velhos do Restelo", dentro e fora da Igreja, dizerem o contrário. Deus não deixa de nos dar sinais sobre qual o caminho a trilhar pela Igreja e por este Mundo em que nos integramos. Como diz Jesus no Evangelho: "Quem tem ouvidos para ouvir, que ouça!"

Este é um Mundo cheio de contradições e onde a indiferença, como o Papa tanto insiste em afirmar, continua a ser um dos grandes males, que nos anestesia e torna incapazes de estar atentos e de fazer algo em favor do próximo, sobretudo, daquele que pelas circunstâncias da sua vida, mais precisa de ser reconhecido, apoiado, defendido, valorizado. O Papa tem conseguido fazer isso, não porque tenha nas suas mãos a solução dos grandes problemas que nos afectam, mas, porque com as suas chamadas de atenção, as suas propostas e os seus gestos proféticos, inesperados, impensados por tantos e até arriscados, insiste em nos arrancar do sofá da passividade e do egoísmo, em que comodamente nos estendemos, sem querer saber do que nos rodeia. Ele é tantas vezes um aguilhão para as consciências anestesiadas de tantos neste Mundo.

Por sua vontade, foi instituído o Dia Mundial dos Pobres, que celebrámos no passado dia 19 de Novembro. Este dia pretende alertar-nos para o drama, o escândalo da pobreza, ou melhor, das diversas pobrezas, que são uma autêntica espada que fere e nos incomoda e não deve ser escondida, antes exige respostas que se multipliquem e globalizem. Lembro-me, a este propósito, que há alguns anos, aquando do Tsunami, o Papa João Paulo II lançou um apelo ao Mundo, insistindo na necessidade de globalizar a solidariedade para com os povos e nações atingidas. Creio que as provocações constantes do Papa Francisco poderiam e deveriam ter este mesmo efeito sobre os cristãos, nomeadamente católicos, mas também sobre tantos homens e mulheres de boa vontade que os há e não são poucos. É preciso erradicar a pobreza e há condições para que isso aconteça, desde que haja vontade e respostas que lhe dêem corpo.

Ao reflectir no que poderia ser feito neste campo, fico pensativo e preocupado quanto ao futuro das nossas sociedades, sobretudo ocidentais, ao perceber como se despendem tantas energias na defesa de interesses de pequenos grupos de pressão, que por terem muitos meios e acesso aos grandes mass media, fazem valer as suas opiniões e pretendem impor-nos uma espécie de colonialismo cultural, como o Papa Francisco tantas vezes afirma. Por outro lado e paradoxalmente, dá a impressão de tantas vezes se pretender pas·sar uma esponja sobre a realidade da pobreza e das pobrezas desta Casa Comum, quando seria possível erradica-la e vencer tantas misérias, assim houvesse mais vontade política e compromisso em lutar, de facto, pelos mais pobres e mais pequenos, e por aqueles que não se podem defender, porque a sua voz não é ouvida, pois nem têm sequer acesso aos grandes púlpitos da actualidade.

Neste Mundo em que vivemos, creio que falta autêntico humanismo, mas é preciso não baixar as mãos e continuar a apostar nas novas gerações, pois, não esperemos colher onde não se semear, e a formação das pessoas é uma tarefa ingente e essencial. São também necessários novos líderes que, não se limitem a tomar medidas avulsas para serem objecto das primeiras capas, em certa comunicação social, e não se contentem com o politicamente correcto, mas sejam capazes de assumir o compromisso de tornar verdadeiramente mais humano, solidário e fraterno este Planeta em que vivemos.

Que o exemplo do Papa Francisco seja uma interpelação e uma luz que vale a pena seguir por todos, sem excepção, e toque igualmente aqueles que, dentro da Igreja, estão mais preocupados com o poder e o prestigio, nas influências, a aparência e a pompa, do que em viver a radicalidade do Evangelho.


in Ecos de Grândola, nº 308, 08 de Dezembro de 2017