esde há muito que nutro pelo papa João XXIII uma imensa simpatia e uma indisfarçável
admiração. Apesar de o terem considerado papa de transição, veio a tornar-se, de facto,
verdadeiramente providencial. A sua visão profética
e arrebatadora, e a sua audácia, permitiram-lhe
conduzir a Igreja
por um caminho de Aggiornamento chamado
Concílio Vaticano II.
Na sua intuição, ação e documentos, palpita um amor abrasador
pela Igreja e pelo mundo,
que o fez justamente merecer o título de "Bom
papa João". Sem
me alargar muito
sobre esta insigne figura, gostava de lembrar uma frase sua, oportuna para estes tempos de turbulência eclesial: "Esta Igreja Santa, de pecadores".
Com efeito,
se a Igreja fosse mera instituição humana, decerto
já teria desaparecido, tais as perseguições, as crises, os pecados,
que caracterizam a sua milenar história. Contudo, ela é de origem divina, e, por isso,
tem a certeza de que Deus a não abandonará e abrirá sempre caminhos
novos de conversão e renovação. Acredito,
pois, que a provação destes tempos, fruto dos erros dos homens, será ocasião,
se houver coragem de os enfrentar com firmeza e verdade,
e ousadia de os corrigir e mudar de rumo, para uma renovação dos corações e das estruturas.
A Igreja
não deve ser espaço para vidas duplas, onde a luz do Evangelho não encontra espaço
para penetrar. Não pode ser refúgio de carreiristas e funcionários, a quem falta humanidade, alma, realismo, e que, tantas vezes, refugiando-se na frieza das leis, pretendem impor fardos pesados
aos outros, quando eles, como diz Jesus
no Evangelho, referindo-se aos fariseus,
nem com um só
dedo os procuram levantar.
Na Igreja deve haver lugar para todos, mas é fundamental que no vocabulário e na vida de cada cristão, a conversão
não seja palavra vã, mero
estribilho, inócuo, e repetitivo, sem consequências existenciais. Como diz S. João: "Quem diz que ama a Deus que não vê e não ama o seu irmão que vê é mentiroso".
Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Diário do Alentejo, 08 de Março de 2019