Estas duas palavras, proferidas pelo Eng. António Guterres aquando da sua eleição como Secretário-geral da Organização das Nações Unidas, são hoje o tema deste artigo, talvez porque elas constituam para mim um desafio permanente e uma luz a iluminar e confirmar o meu caminho.
Quando penso em humildade, imediatamente me vêem à mente as palavras de Santa Teresa de Ávila: a humildade é a verdade. De facto, a humildade é a virtude que nos ajuda, com realismo, a olharmos para nós, para os outros e para tudo o que nos envolve. É a partir dela que eu me encontro com a verdade daquilo que sou, com as minhas qualidades e defeitos, virtudes e pecados, e me disponho a deixar-me ajudar, para me tornar melhor todos os dias. Como cristão, sei que tenho em Cristo o verdadeiro modelo a seguir pois, Jesus, ao assumir a condição humana, deu-nos o primeiro exemplo de humildade, que confirmou depois com a sua crucificação e morte.
Como o Eng. António Guterres nunca escondeu a sua condição de cristão e católico, decerto, que na sua forma de entender e viver a humildade pesou significativamente esta perspectiva de vida, tão querida a quem se dispõe a seguir Cristo.
Esta virtude não é, infelizmente na minha opinião, estimada e promovida nos nossos dias, pelo menos em certos ambientes, e talvez o devesse ser, pois contribuiria decisivamente para combater o egocentrismo, o orgulho e a soberba, que são uma espécie de cegueira, e, como diriam os gregos, ajudaria a formar pessoas de virtude, capazes de pensar nos outros e de os servir, sem interesseirismos, nem clientelas. A ausência de humildade pode, ainda, provocar entre outras doenças o raquitismo ético a imaturidade, o imobilismo, a insensibilidade e a indiferença.
Quanto à gratidão, creio também ser uma virtude necessária, sobretudo, numa sociedade do imediato, do oportunismo e da amnésia. A ausência de gratidão pode provocar também individualismo, dureza de coração, e um sem número de manifestações de desumanidade.
É minha convicção profunda que, numa sociedade de múltiplas relações e interdependências, o natural é cultivarmos a gratidão, a começar pela nossa família, por tanta coisa de que lhe somos devedores, e esta atitude deverá acompanhar-nos ao longo da nossa vida. A gratidão humaniza-nos, faz-nos sentir mais irmãos uns dos outros, mais próximos, mais simples, menos auto-suficientes, dispondo-nos a dar e a receber, e a sentir que também recebemos quando damos, mesmo que o façamos desinteressadamente.
Duma forma simples e clara, sem plásticas, nem superficialidades, temos na nossa frente um autêntico projecto de vida, para quem aspira a fazer algo por este mundo em que vivemos, duma forma concreta, sabendo que um grande caminho começa com pequenos mas decididos passos.
Foi desta forma serena, mas convicta e comprometida, que o Eng. António Guterres, no serviço aos refugiados, foi construindo um projecto de liderança credível, que lhe permitiu conquistar, contra Adamastores e Golias, lobbys e agendas, até os mais improváveis apoios, e ser eleito da forma clara e arrasadora na Assembleia Geral da ONU.
Por tudo isto, devemos sentir um são orgulho por ele, por ser português e por ser o homem que é, não deixando, porém, de acolher o desafio que a sua eleição também significa: trilhar o caminho da humildade e da gratidão.
in Ecos de Grândola, nº 295, 11 de Novembro de 2016