domingo, 27 de janeiro de 2019

Ano Novo, esperança renovada


despertar de um novo ano desafia-nos a uma dose reforçada de esperança e de positividade. Há muitas previsões, algumas catastróficas, mas não esqueçamos que tudo se pode rapidamente alterar, pois, a máquina tempo acelerou num ritmo alucinante. Importa, porém, estarmos atentos aos danos colaterais deste frenesim temporal e existencial, para não nos tornarmos "escravos do tempo", quando deveríamos ser "senhores do tempo".

Ficam alguns votos e esperanças:
  1. No meio da parafernália de prioridades, não nos esqueçamos do ser humano. Ele deve ser o centro e o verdadeiro progresso é aquele que está ao seu serviço, e defende a sua vida, dignidade e direitos.
  2. Prioridade aos mais pequenos, frágeis e marginalizados da nossa sociedade, não aos números ou às coisas, as quais "são para as pessoas e não o contrário" (Cristo).
  3. Face às desigualdades gritantes entre os vários mundos deste mundo, é imperioso aproximarmo-nos mais uns dos outros, não só virtualmente, mas realmente, procurando descobrir e erradicar as suas causas.
  4. Importa vivermos menos centrados em nós, nos nossos egoísmos e noutros ismos, que nos anestesiam em relação ao "outro", e nos levam a vê-lo não como irmão, mas como rival, ou, quiçá, inimigo que nos desinstala e ameaça.
  5. A paz deve ganhar mais raízes e dar mais frutos na relação entre os povos, as nações e os hemisférios, mas também entre as religiões, as famílias e, em especial, dentro do coração de cada um de nós. É lá que nascem os conflitos ou a paz.
  6. Há um binómio a proteger e a promover urgentemente: liberdade e verdade. Ambas são uma espécie de irmãs-gémeas.
  7. Por fim, que a comunicação social e as redes sociais sejam veículos de transmissão também do lado positivo da vida, não se limitando ao negativo, às fake news ou aos likes. É urgente mais informação e menos ideologia, para podermos exercer pessoalmente a capacidade de refletir e de discernir.
Coragem para esta tarefa global e transversal.


Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Diário do Alentejo, 25 de Janeiro de 2019



Mais um Natal desponta


O Natal é uma época do ano que pode ser vivida de diferentes formas e com vários sentidos; não deveríamos, contudo, esquecer a sua essência, a sua genuinidade e profundidade. Natal significa nascimento, nascimento de Jesus, para nós cristãos o Filho de Deus. que se tornou um de nós para que nós compreendamos o quanto Deus nos ama, ao ponto de nos adotar como filhos, no Seu Filho Jesus. O sentido fundamental do Natal é, pois, claramente e declaradamente humanista e humanizador; é uma festa centrada na pessoa, nas pessoas.

É claro que todas as demais dimensões do Natal são respeitáveis e têm a sua importância: Festa da Família, Tempo de Paz, celebração e convívio, oferta de prendas, etc. Há lugar para tudo, pois todas estas dimensões foram crescendo ao longo dos tempos, ganhando raízes e razão de ser. O equívoco reside na obsessão e centralidade das coisas materiais, apresentadas até à exaustão como o TUDO do Natal.

O Filósofo Gabriel Marcel bem nos alertou para a luta, que nos nossos tempos ocorre, entre o Ser e o Ter, e é preciso estar consciente desta realidade, sem nos deixarmos iludir por falsas promessas, segundo as quais, para se ser, é preciso ter, ou, pior ainda, que basta ter coisas para se ser feliz. Não é verdade. A felicidade pertence a uma dimensão superior, espiritual, acima da matéria, não se compra, não se aluga, nem< se vende. As coisas materiais podem dar uma ajuda na criação das condições essenciais, para que todas as pessoas possam viver com mais dignidade; contudo, não reside na sua posse e fruição, a solução miraculosa de todas as necessidades essenciais e existenciais da Humanidade.

O espírito do Natal está muito ligado a S. Francisco de Assis, a quem também devemos a tradição do Presépio, e que nos deixou, numa oração, este legado extraordinário, monumental e simultaneamente simples, que todos deveríamos conhecer e experimentar: "é dando que se recebe." Este dar não se identifica necessariamente com coisas, mas traz consigo o desafio de nos descentrarmos, de nos abrirmos e nos darmos, de forma gratuita e desinteressada, ao nosso próximo, o qual pode ser qualquer pessoa com quem partilhamos esta Casa Comum.

Quanto mais crescer em mim a capacidade de me libertar do Ter, tanto mais se enriquece em mim o Ser, e se alargam os meus horizontes, superando o horizonte da tacanhez do meu umbigo, para poder vislumbrar a Humanidade, em toda a sua plenitude. Uma Humanidade que vive como eu neste Planeta Azul, que necessita urgentemente, de uma transfusão de justiça, solidariedade e fraternidade, para vencer a tentação do egoísmo, da misantropia, do materialismo, do imediatismo, dos nacionalismos, para que possam finalmente germinar e frutificar em nós e à nossa volta, as sementes de um Mundo Novo que é possível e desejável. Na verdade, está nas nossas mãos construí-lo e legá-lo às gerações futuras, como uma realidade possível e não uma miragem ou mera utopia.

Santo Natal e abençoado Ano Novo.


in Ecos de Grândola, nº 321, 11 de Janeiro de 2019



quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

O Advento e a Renovação



Para nós Católicos aproxima-­se um Tempo de importância crucial: o Advento e, de seguida, o Natal. Aliás, é habitual entre nós, que tempos fortes, como o Natal e a Páscoa, sejam preparados, respetivamente pelo Advento e pela Quaresma. A função pedagógica destes Tempos é ajudar-nos a viver intensamente e sempre com novidade os acontecimentos fundamentais da cristã: o Nascimento de Jesus, Filho de Deus feito Homem, e a Sua Paixão, Morte e Ressurreição.

Todos estes acontecimentos podem ser situados no tempo e no espaço. A força da sua mensagem renovadora, porém, é sempre atual e actualizável na vida dos crentes, e daqueles que se vão abrindo à luz da fé. Estes tempos convidam-nos a sintonizarmos com o seu espírito, entrando dentro deles, ou melhor, deixando que Deus entre em nós e esteja mais presente nas nossas vidas, dando-lhes mais sentido e enchendo-as de luz, de paz e de amor.

Em todos os tempos e momentos a Palavra de Deus, que está sempre presente, desafia-nos a que não nos limitemos a ser meros ouvintes, mas que a acolhamos, e que a deixemos dar fruto nas nossas vidas, e o fruto por excelência, diz Jesus, é o amor feito realidade nas pessoas e nas situações concretas, pois não se pode amar a Deus em abstrato. S. João chega mesmo a dizer que: "quem diz que ama a Deus que não vê e não ama o seu irmão que vê, é mentiroso.

A fé cristã, nestes tempos em que nos encontramos, deve ser significativa e produzir resultados visíveis nas nossas vidas, se quisermos testemunhar, d·e verdade, que acreditamos em Jesus, Caminho, Verdade e Vida. Na verdade, uma sem obras e, sobretudo, sem transformação autêntica daqueles que acreditam, é uma fé não cristã, mas supersticiosa, superficial, aparente, farisaica, diria Jesus no Evangelho. E isto aplica-se a todos na Igreja, desde o Papa aos fiéis leigos, passando pelos Cardeais, Bispos, Padres e Consagrados!

Aproveitemos este Advento para uma revisão profunda das nossas vidas, e da importância da em nós, para que, a partir do balanço feito, possamos mudar e crescer, uma vez que a alegria de Deus, o nosso Pai do Céu, é que nós, todos, dêmos fruto, muitos frutos, na caridade para a vida do Mundo. Estamos no Mundo e é a este Mundo que nós cristãos somos chamados a levar esta Boa Notícia: temos um Deus que nos ama, ao ponto de nos dar Jesus, o Seu Filho, para n'Ele nos tornarmos filhos de Deus e irmãos, e, por isso mesmo, corresponsáveis uns pelos outros e por esta Casa Comum que habitamos e que devemos respeitar e preservar para as gerações futuras. Jesus mostrou-nos o caminho ao encarnar, assumindo a nossa humanidade e fazendo-se um de nós; por isso, não podemos fugir, alheando-nos do que se passa à nossa volta; não, a cristã vive-se em todas as dimensões da nossa vida quotidiana de forma concreta e junto de pessoas, contextos e situações igualmente concretas.

Ouçamos o Papa Francisco, que não se cansa de nos exortar a que levemos a luz do Evangelho a todas as "periferias" humanas e existenciais do nosso Mundo, para que a todos possa chegar o amor e o perdão de Deus que não tem limite pois, o único limite é aquele que nós, porque somos livres de O aceitar ou recusar, lhe colocamos.

Um fecundo Advento para todos. Vivamo-lo em paz, serenidade e esperança.


in Ecos de Grândola, nº 320, 14 de Dezembro de 2018