domingo, 22 de setembro de 2019

Objectividade e Subjectividade



Já em anteriores ocasiões dei umas pinceladas nesta temática, mas, não resisto em voltar a ela, pois, nestes últimos tempos, tenho ficado deveras perplexo diante de versões tão contraditórias dos mesmos factos, que me interrogo senão corremos o risco de nos afundarmos no pântano do subjectivismo, no qual a verdade é um náufrago, uma miragem,e apenas reina de forma absoluta: "a minha verdade”.

Há uns anos o Papa Bento XVI afirmava isto mesmo, dirigindo-se a Sacerdotes do Norte de Itália, e alertando-os para o perigo em que incorrem as nossas sociedades ocidentais, do desaparecimento da fronteira entre o bem e o mal, restando apenas o "sentir-me bem ou sentir-me mal" , ou seja, o puro subjectivismo, sem fronteiras, nem balizas.

A subjectividade é, sem dúvida, um valor e a própria Igreja é testemunha ao longo da sua história secular, que a sua desvalorização teve consequências no enfraquecimento ou mesmo banalização da consciência pessoal, da intenção e da finalidade, bem como das circunstâncias levando Igreja e Sociedade, nomeadamente a partir de Descartes e em especial de Kant, a trilharem caminhos diversos ou até mesmo antagónicos.

Se recuarmos, porém, no tempo e mergulharmos até à Idade Média, encontraremos esse homem extraordinário que foi S. Tomás de Aquino, a quem a Igreja muito deve e que, neste campo, defendeu a existência de e um'Tripé', a que ele "Fontes da Moralidade', a saber: "Sujeito, Objecto e Circunstâncias'. Nesta mesma linha, séculos mais tarde, surgirá um outro extraordinário homem, Santo Afonso Maria de Ligório, e, já mais perto de nós, o Concílio Vaticano II que recuperará definitivamente as"Fontes da Moralidade", ajudando, neste como noutros campos, à reaproximação entre Igreja e Sociedade, e lançando as pontes para o estabelecimento de um diálogo mais profícuo e de relações mais estreitas e fiáveis entre ambas.

Encontrar o equilíbrio entre subjectividade e objectividade parece-me ser uma tarefa ingente para o nosso tempo, não só para a Igreja, mas também para a Sociedade, e o caminho mais seguro para evitar os extremos do objectivismo e do subjectivismo, que como diz o povo,"se tocam". Os populismos, as demagogias, os falsos messianismos, que hoje pululam e se espalham com uma enorme facilidade, encontram terreno fértil em gente de consciência débil, "líquida", como diz o Papa Francisco, e pedem uma resposta de sentido contrário, que aposte nos Valores e numa Ética, respeitadora da dignidade e direitos da pessoa e da sua consciência, humanista e humanizadora, racional, atenta ao próximo, nomeadamente ao mais frágil, promotora de uma Ecologia Integral, e capaz de exercer o discernimento de forma criteriosa.

in Ecos de Grândola, nº 329, 13 de Setembro de 2019



Pelos frutos se conhece a árvore


Esta expressão encontramo-la várias vezes no Evangelho e, na sua sequência, Jesus acrescentará que: "uma árvore boa dá bons frutos e uma árvore má dá maus frutos". É evidente, mas esta evidência questiona-nos, escrutina-nos, sobretudo, porque o refrão "bem prega Frei Tomás...", já não serve porque o Mundo mudou, e perante um leque variado de propostas religiosas, quem procura Deus, pode livremente e a resposta que melhor vai de encontro às suas inquietações. A Verdade não se impõe ou melhor, impõe-se por si própria e, só nela se pode construir solidamente.

Graças a Deus que vivemos numa Sociedade em que Estado e Igreja não se confundem, depois de séculos de encontros e desencontros que não são de repetir, a bem do Estado e da própria Igreja, que é hoje muito mais livre para se apresentar como é, na sua realidade e integralidade. Há, porém, duas atitudes a evitar, a primeira, é protagonizada pelos saudosistas, que têm "saudades das cebolas do Egipto", de um passado "glorioso", que já não volta, porque o tempo é marcado pelo devir constante. A segunda atitude, que também não é caminho, supõe a diluição no pensamento dominante, sem propostas de vida alternativas, expressão de uma "sociedade líquida", por um lado, mas, por outro, fortemente marcada e condicionada por agendas bem delineadas, obedecendo a ideologias que, lenta mas paulatinamente, pretendem reduzir a Religião, nomeadamente o Cristianismo, a mera questão de consciência, sem intervenção na Sociedade, um mero fenómeno de Sacristia.

O Mundo mudou, não o esqueçamos, e é, do ponto de vista religioso, também uma espécie de supermercado, por isso, serão os frutos desta vida nova, na nossa vida, que poderão ajudar aqueles que buscam um sentido, a descobri-lo em Cristo, Caminho, Verdade e Vida. E, para que os frutos sejam verdadeiros, a conversão não pode ser mera palavra vã e caduca na nossa boca, mas transformação por dentro em "árvores boas" que, só podem, por isso, dar bons frutos. Com efeito, como afirmou S. Paulo, o imperativo é uma consequência do indicativo: quem é de Cristo, só pode, como Ele viver, a vida de filhos (no Filho).

Há 50 anos o Concílio Vaticano II apontou um caminho, para que a Igreja continue a ser um sinal visível e credível de Cristo e do Seu plano de salvação para toda a Humanidade, e não há alternativa ao caminho que ele traçou. Este caminho passou por um regresso às fontes, ao Evangelho, o qual traz consigo uma força, uma alegria, um entusiasmo, uma liberdade de que nós cristãos devemos dar testemunho, como expressão desta vida nova que vem do Batismo e que, como diz S. Paulo, faz de nós Homens e Mulheres novos/as capazes de cantar na vida o Cântico Novo, pois, como diz Santo Agostinho: "O melhor cântico novo é a vida do cantor".

Confiemo-nos, pois, ao "Agricultor Divino", sem reticências, nem reservas, "escancarando-Lhe" (João Paulo II) o coração!

Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Notícias do Alentejo, 5 de Setembro de 2019



Igreja em Grândola classificada como monumento de interesse público


A Igreja de Santa Margarida da Serra, no concelho de Grândola, distrito de Setúbal, foi classificada como monumento de interesse público, segundo uma portaria do Governo publicada em Diário da República (DR) a cinco de agosto de 2019.

A portaria, assinada pela secretária de Estado da Cultura, Ângela Ferreira, classifica como monumento de interesse público (MIP) a igreja paroquial de Santa Margarida da Serra, incluindo o património móvel integrado", na União das Freguesias de Grândola e Santa Margarida da Serra. "A primitiva Igreja de Santa Margarida terá sido fundada ainda no século XV, embora o templo atual date da segunda metade do século XVII, com sucessivas remodelações estruturais e decorativas nos séculos seguintes", refere o documento, consultado pela agência Lusa.

De acordo com a portaria, a sua localização, "numa pequena e periférica povoação rural, junto à estrada que liga Grândola a Santiago do Cacém, contrasta com as influências eruditas de parte das campanhas ornamentais e do acervo pictórico e escultórico".

"O conjunto edificado, cercado por muro fechado, é composto pelo corpo da igreja, antecedida por galilé coberta por abóbada de ogivas e aberta por arcos de volta perfeita, pela torre sineira, pelo batistério, pela sacristia e por um anexo de arrumações", é referido. O templo, acrescenta o documento, de linhas vernaculares características do maneirismo nacional, alberga uma nave unificada, coberta por teto de madeira e rasgada por capelas laterais e arcos rasos com altares".

Segundo o Ministério da Cultura, "destacam-se, entre outros elementos de particular interesse artístico, o púlpito em madeira policromada, a talha, nomeadamente o retábulo-mor em policromia branca e azul, e a pintura mural do arco triunfal".

Quanto ao património móvel integrado, as atenções concentram-se no "acervo maneirista de escultura policromada", na "pintura em tela, ferragens e algum mobiliário", salienta a portaria.

A classificação da igreja, incluindo o património móvel integrado, "reflete os critérios constantes do artigo 17.º da Lei n.º 10712001, de 8 de setembro, relativos ao caráter matricial do bem, ao seu interesse como testemunho simbólico e religioso, ao seu valor estético, técnico e material intrínseco, à sua conceção arquitetónica, urbanística e paisagística e à sua extensão e ao que nela se reflete do ponto de vista da memória coletiva", resume o ministério.

in Notícias do Alentejo, 5 de Setembro de 2019



Reconhecer o bem que o outro faz



Com alguma frequência, nas homilias das Eucaristias, recordo as pessoas boas, extraordinárias, exemplares, que todos os dias encontro nas ruas e noutros locais da nossa terra, e por elas dou graças a Deus.

Já o disse vezes sem conta e insisto: há mais gente boa do que o contrário, embora o mal faça mais ruído e seja mais notícia, infelizmente. Muitas destas pessoas, mesmo sem viverem explícita e assumidamente como cristãos, são exemplos de humanidade e de serviço desinteressado e gratuito ao próximo, que me deixam interpelações e inquietações, e alguma tristeza, quando penso na falta de humanidade, insensibilidade e egoísmo que marcam a vida de tantos cristãos e que constituem um autêntico obstáculo a que, quem busca a Deus e a um sentido para a sua vida, o encontre na Fé Cristã e na Igreja Católica, em especial.

Sei que não posso mudar os corações: só Deus o pode fazer, mas, pela minha parte, continuo a insistir. E preciso ser coerente entre a fé em Deus que tantas vezes afirmamos ter, e a tibieza, pobreza, direi mesmo mediocridade (afirmava o Santo Padre João Paulo II) que caractetiza a nossa vida como cristãos. É uma responsabilidade grande ser discípulo de Cristo, ouvir tantos apelos à conversão, à santidade, à humanidade, e continuar a viver como senão tivéssemos fé. Somos mais responsáveis, como diz inúmeras vezes Jesus no Evangelho, do que aqueles que, não ouvindo o que nós ouvimos, são um terreno fecundo para que a semente do Evangelho aí venha a germinar um dia e a dar fruto.

Tenho motivos para estar feliz, como pastor destas Terras onde me encontro há mais de 10 anos, por ser testemunha de tantos milagres que Deus tem operado em tantas vidas, mas gostaria de ver ainda muitos mais, ou não tivesse eu escolhido para lema da minha Ordenação Sacerdotal há já 31 anos: "Ai de mim senão evangelizar!' Acredito que a fé cristã tem que ser redescoberta ou descoberta, consoante os casos, porque, infelizmente, nem sempre nós cristãos temos sido capazes de revelar, em toda a sua plenitude o Evangelho e a face misericordiosa de Jesus que, como Bom Pastor, não cessa de nos procurar, para nos revelar o quanto nos ama e como a nossa vida, sem Ele, ainda está incompleta.

Como no-lo testemunha Santo Agostinho, a partir da sua própria experiência, o Senhor clama e grita dentro e fora de cada um de nós, em muitas circunstâncias e acontecimentos da nossa vida Ele aguarda pacientemente até que a Sua voz rompa a nossa surdez, vença os nossos preconceitos e respeitos humanos, e nós O passemos a reconhecer como Caminho, Verdade e Vida, em quem podemos confiar e em quem a nossa existência ganha todo o sentido e experimenta aquela felicidade que só Ele nos pode conceder.

Caro/a leitor/a, aceite este desafio para as suas férias, se as tiver: desafie Deus a que se manifeste na sua vida e que você esteja disponível para ouvir e responder.


in Ecos de Grândola, nº 328, 09 de Agosto de 2019