sexta-feira, 8 de março de 2013

A grandeza de um gesto


A minha estima e admiração pelo Papa Bento XVI cresceu exponencialmente com a notícia da sua renúncia. Na verdade, só um homem da estatura, mas também da simplicidade, de Josef Ratzinger nos poderia desarmar e surpreender com este gesto que causou, decerto, desconcerto e desconforto em tantos, mesmo entre aqueles que constantemente inventavam factos para o denegrirem. Para mim ficou claro que quem assim agia não conhecia a magnanimidade da alma deste homem. A história se encarregará de lhe fazer justiça, disso não tenho dúvida. É isto que, infelizmente, sucede tantas vezes, mesmo noutros âmbitos da vida: criam-se imagens que não correspondem à verdade, e a partir daí não há a preocupação de mostrar a realidade, antes se constrói a partir de preconceitos. Quando os fins justificam os meios, entra-se na lógica do "vale tudo" e deixa de haver limites: é tudo subjectivo, é tudo relativo!

De entre os muitos comentários que li na sequência deste gesto, houve um que me impressionou em especial e que dizia desta forma incisiva: "O papado perdeu em divindade e ganhou em humanidade''. Na verdade, o Papa não é nem um Anjo nem um Santo, mas antes um homem que Deus chamou e a quem foi conferida a missão maior de guiar a Igreja e de ser garante da comunhão desta grande comunidade espalhada pelos cinco Continentes. Cada Papa é diferente, vive num tempo naturalmente diferente, tem características próprias que o distinguem e identificam, e conduz a Igreja com um carisma igualmente específico, embora sempre animado pelo Espírito Santo.

O pontificado de Bento XVI, apesar de breve, deixa traços profundos na Igreja e no Mundo que vale a pena, mesmo que de forma sintética lembrar: o diálogo inter-religioso; o diálogo entre cristãos (ecumenismo); a valorização da razão no diálogo com os não crentes; a renovação da Igreja; continuação do processo de universalização da Igreja e das suas estruturas; firmeza no combate aos excessos dentro e fora da Igreja; afirmação da centralidade da Doutrina Social da Igreja como meio evangelizador e insubstituível na sua acção pastoral, etc.

Voltando ao gesto do Papa, penso poder dizer com todo o realismo, que esta sua atitude manifesta a opção radical de quem veio para servir e não para ser servido. De facto, só quem tem como valor primeiro o bem e o serviço dos outros pode agir como o Papa Bento XVI fez, não se deixando deslumbrar pelo poder, nem procurando nele permanecer até perder as capacidades e/ou "cair da cadeira". A noção perfeita das nossas capacidades e limitações é fundamental para exercermos bem a nossa missão, qualquer que ela seja e, às vezes, não é uma questão de idade, é antes a expressão de uma grande lucidez e, naturalmente, sinal de humildade, a qual segundo a expressão de Sta Teresa de Ávila "é a verdade".

As decisões importantes, quer se trate da nossa vida quer de qualquer outro âmbito, devem, de facto, ser tomadas enquanto temos capacidade de discernimento e decisão.

Obrigado Papa Bento XVI pela sua pessoa e acção pastoral, e pela sua ousadia e clarividência.

Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Ecos de Grândola, nº 251, 08 de Março de 2013