quinta-feira, 19 de julho de 2018

Falta de Humanidade e Solidariedade


O drama dos refugiados, enjaulados em frágeis e superlotadas embarcações e explorados por máfias impiedosas, continua a bater às nossas portas e a mexer nas nossas consciências. Infelizmente, somos despertos quando alguma tragédia, mas apenas se esta for notícia nos mass media. Salvo tais excepções, um silêncio cúmplice anestesia os nossos sentidos, perante um dos maiores problemas da actualidade.

É claro que importa perceber as causas subjacentes a estas grandes movimentações humanas, acossadas e sem esperança nos seus locais de origem, e que consideram que vale a pena arriscar tudo, mesmo que uma consequência provável seja ir jazer anonimamente no fundo do Mar Mediterrâneo. A outra questão exige também resposta: como é possível que seres humanos (desumanos) tratem outros seres humanos como "carne para canhão", fonte de lucro, meros objectos e não pessoas?

A Europa, por outro lado, continua a não dar uma resposta uníssona e coordenada e, os interesses, os jogos nacionais e as estratégias políticas, sobrepõem-se à vida e dignidade humanas e o resultado é, não apenas o que vemos, mas, sobretudo, o que não vemos e que termina geralmente em tragédia silenciosa e silenciada. Impressiona também algum oportunismo, de quem, por diferentes formas e meios, procura colher dividendos. Quantos mais irmãos nossos deverão ainda morrer?

Como europeu esta é uma situação que me choca, até porque a Europa tem sido ao longo dos séculos a "Casa" dos valores humanos, da defesa do ser humano e da sua dignidade. Se vivemos todos nesta Casa Comum e formamos uma única Família Humana, não deixemos que os egoísmos e os individualismos ganhem raízes nos nossos corações, em especial, nos mais jovens. Este Continente necessita de uma forte transfusão de humanidade, para que não desfaleçam os seus ideais, para que continuemos a escrever a sinfonia que séculos estamos a compor, e para que os outros povos possam continuar a olhar para nós, como uma referência que vale a pena seguir.

Foi também na Europa que o Cristianismo ganhou raízes, e daqui foi levado aos quatro cantos da Terra, um projecto para o qual nós portugueses dêmos um assinalável contributo. É preciso, por isso, ter memória, não esquecer a nossa identidade, pois, esquecê-la é hipotecar o nosso futuro, e um futuro melhor é possível e desejável; e agir!

in Ecos de Grândola, nº 315, 13 de Julho de 2018