O drama dos refugiados, enjaulados em frágeis e superlotadas embarcações
e explorados por máfias
impiedosas, continua a bater às
nossas portas e a mexer nas nossas
consciências. Infelizmente, só
somos despertos quando há alguma tragédia, mas
apenas se esta for notícia
nos mass media. Salvo tais excepções, um silêncio cúmplice anestesia os nossos sentidos, perante
um dos
maiores problemas da actualidade.
É claro que importa perceber as causas subjacentes a estas grandes movimentações
humanas, acossadas e sem esperança nos seus locais
de origem, e que consideram que vale a pena arriscar tudo, mesmo que uma
consequência provável seja ir jazer anonimamente no fundo do Mar Mediterrâneo. A outra questão exige também resposta: como é
possível que seres humanos (desumanos) tratem outros seres humanos como
"carne para
canhão", fonte de lucro, meros objectos e não pessoas?
A Europa, por outro lado, continua a não dar uma resposta uníssona
e coordenada e, os interesses, os jogos nacionais e as estratégias políticas, sobrepõem-se à vida e dignidade humanas
e o resultado é, não
apenas o que vemos, mas, sobretudo, o que não vemos e que termina
geralmente em tragédia
silenciosa e silenciada. Impressiona também algum oportunismo, de quem,
por diferentes formas e meios, procura colher
dividendos. Quantos mais irmãos nossos
deverão ainda morrer?
Como europeu esta
é uma situação que me choca,
até porque a Europa tem sido ao longo dos séculos a "Casa" dos valores humanos, da defesa do ser humano e da sua dignidade. Se vivemos todos nesta Casa Comum e formamos uma única
Família Humana, não deixemos que os egoísmos e os individualismos ganhem
raízes nos
nossos corações, em especial, nos mais jovens. Este Continente necessita de uma forte transfusão de humanidade, para que não desfaleçam os seus ideais, para que
continuemos a
escrever a sinfonia que há séculos
estamos a compor,
e para
que os outros povos possam continuar a olhar para nós, como uma referência que vale a pena seguir.
Foi também na Europa que o Cristianismo ganhou raízes, e daqui
foi levado aos quatro cantos da Terra, um projecto para o qual nós portugueses dêmos um assinalável contributo. É preciso, por isso, ter memória, não esquecer a nossa identidade, pois, esquecê-la é hipotecar o
nosso futuro, e um futuro melhor
é possível e desejável; e agir!
in Ecos de Grândola, nº 315, 13 de Julho de 2018