Como
tem sido minha prática nestes artigos que, com muito gosto, vou
partilhando com os nossos leitores nas páginas do ECOS, não pretendo
envolver-me em questões que considero de carácter estritamente político
ou político-partidário. É o que também farei neste artigo.
A
Crise é hoje um tema incontornável nestes tempos conturbados que se
vivem em Portugal, na União Europeia e neste nosso Mundo. Quer
queiramos, quer não esta é a nossa realidade e é com ela que temos de
lidar. Como atrás afirmei, não entrarei na análise das medidas da
Troika, do Governo ou das propostas das Oposições. O que me importa é,
sobretudo, manifestar a minha convicção de que esta é uma ocasião
soberana para revermos as nossas prioridades, as opções que temos vindo a
fazer e, se quisermos ir mais longe, para nos interrogarmos sobre o
modelo de desenvolvimento e de sociedade que têm vindo a ser
implementados no nosso país e nos demais países.
Decerto
há muitos valores e opções acertadas, que, por isso, não discuto, e que
aceito mas, como cidadão e como cristão, considero que se tem seguido
por caminhos com os quais não concordo, e, mais, estou convicto de que
são errados e geradores de falsas esperanças e de opções anti-humanas.
Passo a apresentá-los em jeito de tópicos, para não ser muito
fastidioso, apontando, simultaneamente, valores e princípios que julgo
alternativas mais credíveis:
- O modelo de desenvolvimento não tem colocado as pessoas no centro das suas preocupações, nem tem contribuído para um crescimento harmónico na Sociedade, mas antes tem arrastado para um fosso, que cada dia cresce entre cidadãos do mesmo país, isto para já não me referir às diferenças abissais entre Estados;
- A vida e a dignidade do ser humano devem ser os valores primeiros que importa defender e promover, sobretudo, daqueles que têm menos capacidade de se manifestarem: crianças, idosos e doentes;
- É preciso promover a verdade e a transparência no modo de vida, a começar por aqueles que têm mais responsabilidades, para que não se crie a sensação de que há várias classes de cidadãos e que a alguns tudo é permitido, sem limites, e na completa impunidade;
- O Estado deve renovar-se e convencer os cidadãos de que é "uma pessoa de bem", o mesmo se diga dos políticos, pois não é essa a opinião que neste momento os cidadãos deles têm;
- Não podemos viver acima das nossas possibilidades, criando necessidades que não existem e transmitindo a ideia, segundo a qual, para se Ser é preciso Ter e/ou Parecer;
- O individualismo e o egoísmo não podem ser promovidos como ideal de vida, sob pena de se perder a noção de que o bem comum é um valor maior e prioritário em qualquer sociedade;
- A solidariedade é um apelo constante a não nos esquecermos da responsabilidade pela nossa "casa comum", e a vencermos a tentação de nos esquecermos de que somos irmãos, logo, responsáveis uns pelos outros, em especial, pelos mais pobres e desamparados;
- A família não pode ser marginalizada, propondo outros modelos cuja consistência e consequência são imprevisíveis, nem os filhos devem ser considerados um peso, pois sem crianças não há futuro, nem esperança;
- O facilitismo e a recusa do sacrifício não podem ser as bandeiras da modernidade e da actualidade, pois sem espírito de renúncia e compromisso nada se constrói de consistente;
- O subjectivismo e o relativismo não podem ser lei, sob pena do individualismo se tornar rei, e de perdermos as referências essenciais que nos permitirão discernir o bem do mal.
Decerto
muito mais haveria para dizer, mas, ficará para um próximo artigo.
Entretanto, não nos esqueçamos de que Crise "rima" com contenção, com
sobriedade, com mudança!
Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Ecos de Grândola, nº 235, 11 de Novembro de 2011