o ouvir as diversas tentativas de leitura e explicação das possíveis causas da altíssima taxa de abstenção nas eleições europeias, veio-me à memória a célebre frase: quem vem primeiro, o ovo ou a galinha?
A verdade é que nenhuma das explicações me convenceu cabalmente, e não há dúvidas de que a abstenção foi o partido mais votado e com maioria absoluta. Escolher não escolher só enfraquece a democracia, a qual, apesar de todas as suas imperfeições, continua a ser o sistema que trata os cidadãos por igual, pois não há votos de qualidade. A cada pessoa corresponde exatamente a mesma responsabilidade de edificar a res publica.
É, por isso, fundamental investir numa cultura que favoreça o sentido crítico, que ajude a refletir sobre os erros, para evitar que os mesmos se voltem a repetir.
Nesta linha, uma das práticas que mais aprecio na fé cristã é o exame de consciência. Este permite-nos mergulhar dentro de nós mesmos, perceber os nossos erros e mudar, sem procurar justificações, que só servem de consolo, mas que não se traduzem em alteração alguma.
É o que acontece ao doente que, ao não assumir a doença e a necessidade de se tratar, vê a sua situação agravar-se dia após dia.
A desvalorização deste direito/dever em alguns países contrasta com a realidade da sua ausência numa percentagem significativa da população mundial. Na verdade, a maior democracia é a Índia, mas o mais populoso país é a China. Pensemos também nas várias ditaduras que prepotentemente não permitem que os cidadãos tenham todos a mesma dignidade e o direito de exercer a cidadania.
Se é verdade que a democracia não se esgota no ato de votar e supõe outras formas criativas de intervir e melhorar a sua qualidade (papa João Paulo II), não votar é demitirmo-nos das nossas responsabilidades coletivas.
A democracia constrói-se com a participação dos cidadãos.
Votemos! Não permitamos que minorias ideológicas e extremistas preencham o vazio deixado pela abstenção.
Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Diário do Alentejo, 12 de Julho de 2019