sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

O que é a conversão?


Muitas vezes dou comigo a reflectir sobre o real significado da conversão?!

Se olho para o Novo Testamento, não tenho dúvidas de que ela implica uma autêntica e radical mudança de vida naqueles que se encontram com Jesus. Basta ler os relatos do chamamento dos primeiros Discípulos, de Mateus, de Zaqueu, da mulher adúltera, de Paulo, da vida dos primeiros cristãos e comunidades. É impossível ficarmos indiferentes perante a força e a verdade que emana destes textos!

A história da Igreja também está cheia de testemunhos admiráveis de vidas renovadas, porque iluminadas pelo encontro com o Ressuscitado: S. Francisco de Assis, Santo António de Lisboa (e Pádua), Sto. lnácio de Loyola, Santa Teresa de Ávila, Santa Teresa do Menino Jesus, Santo Afonso Maria de Ligório, etc. A lista é interminável e está sempre a ser actualizada,, tais as maravilhas que o Senhor contínua a operar naqueles que chama, para que sejam luz, sal e fermento no Mundo(cf. Mt 5, 13-16).

É claro que, em dois mil anos de­ história do Cristianismo, nem tudo é luz e santidade, obvia­mente; mas, como diz Jesus no Evangelho "uma árvore boa deve dar bons frutos" (çf. Mt 7, 17-20), e, pelo Baptismo fomos enxertados em Cristo para nos tornarmos "árvore" boa, e podermos dar bons frutos. Contudo, isso só acontecerá se, como diz S. João, permanecermos intima­mente "unidos a Ele" (cf. Jo 15, 4-7). E esta é uma questão essen­cial: Ser cristão, sem permanecer unido a Cristo, é como ser ramo separado da árvore, é viver à deriva, ao sabor dos ventos e das marés, confiado apenas na nossa intuição e força; e o resultado só poderá ser, como dizia o "bom Papa" e Santo João XXIII, nos anos 60, "o divórcio entre a fé e a vida dos cristãos", na sua opinião, o maior escândalo dos nossos tempos!

Volto novamente à razão de ser deste texto: a conversão. Creio que há um abuso na sua utili­zação. Deixo, pois, algumas das muitas interrogações que se me têm colocado:

* Como se pode falar de con­versão, insistindo na nossa condição de pecadores, mas não se dá um passo em frente, com a ajuda da graça divina, para se mudar efectivamente de vida? Será que cremos firmemente na redenção que Cristo operou na Sua morte por nós e na vida de ressuscitados que n'Ele já vivemos?

* Como pode haver conversão, quando não brilha o "esplendor da Verdade" (e só ela liberta) na nossa vida, e os fins justificam os meios, sendo visíveis, tantas vezes, os sinais de estratégia de conquista e domínio, em certas estruturas da Igreja, lobbies de poder que escandalizam os corações simples e afastam da verdadeira comunhão eclesial?

* Como pode acontecer conver­são, quando entre o que se diz e o que se faz não há coincidência, nem consequências, e tudo con­tinua na mesma, querendo dar impressão de ser essa a vontade de Deus, e nós mera ocasião para que Ele actue?

* Como se pode falar de con­versão, quando o serviço, a simplicidade, a pobreza, a partilha e a transparência são ilustres desconhecidas?

* Como se pode falar de conversão, quando, em certos ambientes clericais/eclesiais, como tantas vezes nos lembra o Papa Francisco, imperam a intriga, a maledicência, o orgulho, o ciúme e a inveja?

* Como se pode falar de con­versão, quando não há frutos visíveis de crescimento e renovação na comunidade cristã, e a estagnação e a manutenção se tomam norma, ano após ano, apesar de sucessivos Planos Pastorais?

Não esqueçamos que só há uma pessoa em nós, seres humanos onde o Espirito Santo é a alma da nossa alma, pelo que, a verdadeira conversão tem de vir de dentro para fora; como afirma S. Paulo, o indicativo torna-se imperativo, ou seja, a fé deve frutificar para ser autêntica, pois, como dirá S. Tiago, uma fé sem obras "é morta" (cf. Tgo 2, 26). Creio que cada um de nós cristãos, a começar por mim, deve­ríamos ser muito mais críticos e criteriosos no uso das palavras, para que elas não se tornem rotineiras e insignificantes, estéreis e vulgares, perdendo todo o seu sentido e força.

Falemos menos, dêmos mais atenção aos frutos que atestam a qualidade da árvore, não bus­quemos justificações, e, sobretudo, peçamos ao Espírito Santo que faça tremer os alicerces da Igreja, das nossas Comu­nidades, Semínários e Casas Religiosas, Serviços e Movi­ mentos, porque Ele é o autêntico e fundamental caminho e agente da verdadeira conversão e renovação na Igreja.

Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
08 de Julho de 2021