sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Ver, julgar e agir


É frequente ouvir dizer que "isto está mal", "aquilo também"... "não há nada a fazer", "está tudo perdido", etc, etc, etc.

Este tipo de comentários enferma de uma mentalidade que me parece nada trazer de positivo, na medida em que apenas se limita a ler a realidade, a preto e branco, no geral, partindo de um prisma discutível de negatividade, e a julgar, se tal for o caso. Mas, e depois? Fica-se apenas por aí? Que propostas de mudança para melhor? Que gestos e que compromissos que tragam algo de diferente e de melhor são apresentados?

Se o silêncio e a apatia não são positivos porque manifestam desinteresse e abrem a porta à alienação e à fuga da realidade também não é menos nociva a discussão superficial e estéril, porque dela não surgem igualmente consequências que envolvam os seus autores. Razão tem o povo ao dizer que "os extremos se tocam".

Há ainda uma expressão que se utiliza no nosso país, na gíria futebolística, mas que aqui também tem aplicação: "ser treinador de bancada". É fácil exercer esta profissão e dar sentenças sobre tudo e todos, mas, o que resulta daqui? Nada! Palavras, apenas palavras e às vezes demagogia. Na Igreja existe um Movimento, embora neste momento tão tenha a expressão que já teve noutros períodos, chamado: "Acção Católica'. Um dos seus principais lemas resumia-se em três verbos: Ver, Julgar e Agir. Apesar da clareza deste tripé, penso não ser fácil realizar o que nele se preconiza. Senão vejamos. O Ver parece simples, o julgar já pressupõe ter instrumentos para efectuar esta operação, quanto ao agir, é ainda mais complexo, pois para agir é necessário abandonar o torpor, o comodismo, o "dolce fare niente", e empenhar-se em fazer algo de diferente e de melhor, e melhorar aquilo que a visão e o juízo descobriram.

Ao olhar para a realidade do nosso país e para os comentários da lista dos infindáveis "profetas" que se limitam a ver e a julgar, apenas sob determinada perspectiva, apetecia-me dizer tantas vezes: mas o que é que você propõe e está disposto/a fazer?

É claro que ao dizer isto me estou a comprometer eu próprio em fazer algo, caso contrário, poderei cometer o mesmo erro que é objecto da minha crítica. Assumo esse risco e espero poder dar o meu contributo para inverter este ciclo vicioso do Ver e Julgar, sem Agir.

Este lema, apesar de ter sido pensado num contexto cristão e proposto a cristãos, que não desejem ser meros ouvintes, mas actores comprometidos na história deste mundo, pode, sem dúvida, ser entendido e seguido mesmo por quem não seja cristão, ou mesmo crente, desde que esteja disposto a fazer alguma coisa para que mude algo daquilo que julgamos não estar bem.

Foi com este mesmo espírito que Baden Powell, fundador do Escutismo, desafiou os escuteiros a não caírem no imobilismo e na demagogia mas a procurarem: "deixar este mundo um pouco melhor do que o encontraram". Porque não aceitamos também nós este desafio para o novo ano que iniciámos há pouco? Tanta coisa mudaria!

Caros leitores, para vós e para mim deixo este apelo, na certeza de que se o acolhermos poderemos deixar a nossa marca positiva "a nossa pegada ética e existencial" no mundo em que vivemos. Coragem. O presente e o futuro esperam isso de nós e os mais novos merecem-no.
Pe. Manuel António Guerreiro do Rosário
in Ecos de Grândola, nº 250, 08 de Fevereiro de 2013