Palavras de Bento XVI durante a Audiência Geral de hoje pela manhã
ROMA, Quarta-feira, 30 Janeiro 2013
A
 Audiência Geral desta manhã ocorreu às 10h30 na Sala Paulo VI, onde o 
Santo Padre Bento XVI encontrou grupos de peregrinos e fieis 
provenientes da Itália e de toda parte do mundo. No discurso em língua 
italiana o Papa continuou o ciclo de catequeses dedicados ao Ano da fé. A
 Audiência Geral se concluiu com o canto do Pater Noster e com a Bênção 
Apostólica. Publicamos a seguir a tradução de ZENIT das palavras do 
Pontífice:
***
Creio em Deus, Pai Todo-Poderoso
Na catequese da quarta-feira passada, consideramos as palavras 
iniciais do credo: "Creio em Deus". Mas a profissão de fé especifica 
esta afirmação: Deus é o pai todo-poderoso, criador do céu e da terra. 
Gostaria que reflectíssemos agora sobre a primeira e fundamental 
definição de Deus que o credo nos apresenta: ele é pai.
Nem sempre é fácil falar de paternidade hoje. No ocidente, em 
especial, há muitos factores que podem impedir uma relação pacífica e 
construtiva entre pais e filhos, como as famílias desestruturadas, os 
compromissos de trabalho mais absorventes, as preocupações e, tantas 
vezes, a dificuldade para equilibrar o orçamento familiar, além da 
invasão distrativa da mídia na vida diária. A comunicação se torna 
difícil, a confiança pode ser perdida e a relação com a figura do pai 
pode se tornar problemática. Assim, quando não se tem modelos adequados 
de referência, torna-se difícil também imaginar Deus como pai. Para 
aqueles que tiveram a experiência de um pai muito autoritário e 
inflexível, ou indiferente e pouco afectuoso, ou mesmo ausente, não é 
fácil pensar com serenidade em Deus como pai e entregar-se a ele com 
confiança.
A revelação bíblica, no entanto, nos ajuda a superar essas 
dificuldades ao falar de um Deus que nos mostra o que significa 
verdadeiramente ser "pai". E é especialmente o evangelho que nos revela o
 rosto de Deus como um pai que ama até a doação do próprio filho para a 
salvação da humanidade. A referência à figura paterna ajuda a 
compreender um pouco do amor de Deus, mesmo que o amor divino seja 
infinitamente maior, mais fiel, mais total que o de qualquer homem. 
“Quem de vós”, pergunta Jesus aos discípulos para lhes mostrar o rosto 
do pai, “ao filho que lhe pedir pão, dará uma pedra? E, se pedir um 
peixe, lhe dará uma serpente? Se vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas 
dádivas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai, que está nos céus, 
dará coisas boas aos que lhe pedirem" (Mt 7,9-11; cf. Lc 11,11-13 ). 
Deus é nosso pai porque nos abençoou e escolheu antes da criação do 
mundo (cf. Ef 1,3-6) e fez de nós, realmente, seus filhos em Jesus (cf. 1
 Jo 3,1). E, como pai, Deus acompanha com amor a nossa vida, dando-nos a
 sua palavra, os seus ensinamentos, a sua graça, o seu Espírito.
Ele, como revelado por Jesus, é o pai que alimenta as aves do céu sem
 que elas precisem plantar ou colher, e reveste de cores maravilhosas as
 flores do campo, com vestes mais belas que as do rei Salomão (cf. Mt 
6,26-32 e Lc 12,24-28). E nós, acrescenta Jesus, valemos muito mais do 
que as flores e as aves do céu! E se Deus é bom o suficiente para fazer 
"nascer o seu sol sobre maus e bons, e vir a chuva sobre os justos e 
sobre os injustos" (Mt 5,45), podemos sempre, sem medo e com total 
confiança, confiar-nos ao seu perdão de pai quando trilhamos o caminho 
errado. Deus é um pai bom que acolhe e abraça o filho perdido e 
arrependido (cf. Lc 15,11), que dá gratuitamente a quem pede (cf. Mt 
18,19; Mc 11,24; Jo 16,23) e que oferece o pão do céu e a água viva que 
dá a vida eterna (cf. Jo 6,32.51.58).
O filho orante do Salmo 27, cercado por inimigos, assediado pelos 
maus e por caluniadores, enquanto pede a ajuda do Senhor e o invoca, dá o
 seu testemunho cheio de fé, dizendo: "Meu pai e minha mãe me 
abandonaram, mas o Senhor me acolheu" (v. 10). Deus é um pai que nunca 
abandona os seus filhos, um pai amoroso que apoia, ajuda, acolhe, 
perdoa, salva, com uma fidelidade que supera imensamente a dos homens, 
para abrir-se uma dimensão de eternidade. "Porque o seu amor é para 
sempre", repete a cada verso, como em uma ladainha, o Salmo 136, 
percorrendo a história da salvação. O amor de Deus pai nunca falha, 
nunca se cansa de nós; é amor que se dá até o extremo, até o sacrifício 
do próprio filho. A fé nos dá esta certeza, que se torna uma rocha 
segura para a construção da nossa vida: nós podemos enfrentar todos os 
momentos de dificuldade e de perigo, a experiência do tempo escuro da 
crise e da dor, apoiados na certeza de que Deus não nos deixa sós e fica
 sempre perto, para nos salvar e nos levar à vida eterna.
É em Jesus que se mostra por inteiro o rosto benevolente do pai que 
está nos céus. É conhecendo Jesus que podemos conhecer o pai (cf. Jo 
8,19; 14,7), e, vendo-o, vemos o pai, porque ele está no pai e o pai 
está nele (cf. Jo 14,9.11). Ele é a "imagem do Deus invisível", como 
definido pelo hino da Carta aos Colossenses, "primogénito de toda a 
criação... primogénito de quem ressuscitou dos mortos", "por meio do 
qual temos a redenção, a remissão dos pecados" e a reconciliação de 
todas as coisas, "tendo pacificado com o sangue da sua cruz tanto as 
coisas que estão na terra quanto aquelas que estão nos céus" (cf. Col1 
,13-20).
A fé em Deus pai nos pede crer no filho, sob o agir do Espírito, 
reconhecendo na cruz que salva a revelação final do amor divino. Deus é 
nosso pai ao nos dar o seu filho; Deus é nosso pai perdoando os nossos 
pecados e nos trazendo a alegria da vida ressuscitada; Deus é nosso pai 
nos dando o Espírito que nos torna filhos e nos permite chamá-lo, na 
verdade, "Abba, Pai!" (cf. Rm 8,15). É por isso que, ao nos ensinar a 
orar, Jesus nos convida a dizer "pai nosso" (Mt 6,9-13; cf. Lc 11,2-4).
A paternidade de Deus é amor infinito, ternura que se inclina sobre 
nós, filhos frágeis, necessitados de tudo. O Salmo 103, o grande hino de
 misericórdia divina, proclama: "Assim como um pai é terno para com seus
 filhos, o Senhor é terno para com quem o teme, porque ele sabe do que 
somos feitos, ele se lembra de que somos pó" (Sl 103,13-14). É 
justamente a nossa pequenez, a nossa frágil natureza humana, a nossa 
fraqueza, que se transforma em apelo à misericórdia do Senhor para que 
ele manifeste a sua grandeza e ternura de pai, ajudando-nos, 
perdoando-nos e salvando-nos.
E Deus responde ao nosso apelo enviando o seu filho, que morre e 
ressuscita por nós; entra em nossa fragilidade e faz o que, por si só, o
 homem nunca poderia fazer: ele toma sobre si o pecado do mundo, como 
cordeiro inocente, e nos reabre o caminho para a comunhão com Deus, 
tornando-nos verdadeiros filhos de Deus. É ali, no mistério pascal, que 
se revela em toda a sua luminosidade o rosto definitivo do pai. E é ali,
 na cruz gloriosa, que acontece a plena manifestação da grandeza de Deus
 como "Pai Todo-Poderoso".
Mas podemos perguntar: como é possível imaginar um Deus Todo-Poderoso
 quando olhamos para a cruz de Cristo? Como, se vemos esse poder do mal,
 que chega ao ponto de matar o filho de Deus? Nós esperamos uma 
omnipotência divina de acordo com os nossos padrões de pensamento e com 
os nossos desejos: um Deus todo-poderoso que resolva os problemas, que 
nos evite as dificuldades, que vença o adversário, que mude o curso dos 
acontecimentos e anule a dor. Diversos teólogos dizem que Deus não pode 
ser omnipotente, pois, se fosse, não haveria tanto sofrimento, tanto mal 
no mundo. Diante do mal e do sofrimento, para muitos, para nós, é 
problemático, é difícil acreditar em um Deus Pai Todo-Poderoso. Alguns 
procuram refúgio em ídolos, cedendo à tentação de encontrar uma resposta
 numa omnipotência "mágica" e nas suas promessas ilusórias.
Mas a fé no Deus Todo-Poderoso nos conduz por caminhos muito 
diferentes: nos leva a aprender que o pensamento de Deus é diferente do 
nosso, que os caminhos de Deus são diferentes dos nossos (cf. Is 55,8) e
 que mesmo a sua omnipotência é diferente: não é uma força automática ou 
arbitrária, e sim um poder caracterizado por uma liberdade amorosa e 
paterna. Deus, ao criar seres livres, dando-lhes liberdade, renunciou a 
uma parte do seu poder, permitindo o poder da nossa liberdade. Ele ama e
 respeita a livre resposta de amor ao seu apelo. Como pai, Deus quer que
 nos tornemos seus filhos e vivamos como tais em seu Filho, na comunhão,
 na intimidade plena com ele. A sua onipotência não se expressa na 
violência, não se expressa na destruição de todo poder adverso, como nós
 gostaríamos, mas sim no amor, na misericórdia, no perdão, na aceitação 
da nossa liberdade e no incansável chamado à conversão do coração, numa 
atitude aparentemente frágil: Deus parece frágil, se pensarmos em Jesus 
Cristo orando, deixando-se matar. Uma atitude aparentemente débil, feita
 de mansidão, paciência e amor, demonstra que este é o verdadeiro modo 
de ser poderoso! Este é o poder de Deus! E este poder vencerá! O sábio 
do livro da Sabedoria se volta para Deus dizendo: "És misericordioso 
para com todos porque tudo podes; fechas os olhos para os pecados dos 
homens, à espera do seu arrependimento. Tu amas todas as coisas que 
existem... És indulgente com todas as coisas porque são tuas, Senhor, 
que amas a vida" (11,23-24a.26).
Só os realmente poderosos podem suportar o mal e se mostrar 
compassivos; só os realmente poderosos podem exercitar plenamente o 
poder do amor. E Deus, a quem pertencem todas as coisas, porque todas as
 coisas foram feitas por ele, revela a sua força amando tudo e a todos, 
em uma espera paciente pela conversão de todos nós, os homens, que ele 
deseja ter como filhos. Deus espera a nossa conversão. O amor 
todo-poderoso de Deus não tem limites, tanto que "ele não poupou o 
próprio filho, mas o entregou por todos nós" (Rm 8,32). A omnipotência do
 amor não é a do poder do mundo, mas a do total doar, e Jesus, o filho 
de Deus, revela ao mundo a omnipotência verdadeira do pai dando a vida 
por nós, pecadores. Este é o real, autêntico e perfeito poder divino: 
responder ao mal não com o mal, mas com o bem; aos insultos com o 
perdão, ao ódio assassino com o amor que faz viver. Assim o mal é 
derrotado, porque o amor de Deus o lavou; assim a morte é finalmente 
vencida, porque é transformada no dom da vida. Deus pai ressuscita o 
filho: a morte, a grande inimiga (cf. 1 Cor 15,26), é privada do seu 
veneno (cf. 1 Cor 15,54-55), e nós, libertados do pecado, podemos viver a
 nossa realidade de filhos de Deus.
Quando dizemos "Creio em Deus Pai Todo-Poderoso", expressamos a nossa
 fé no poder do amor de Deus, que, em seu filho morto e ressuscitado, 
derrota o ódio, o pecado, o mal, e nos dá a vida eterna, aquela dos 
filhos que desejam estar para sempre na "casa do pai". Dizer "Creio em 
Deus Pai Todo-Poderoso", no seu poder, no seu modo de ser pai, é sempre 
um ato de fé, de conversão, de transformação dos nossos pensamentos, de 
todo o nosso afecto, de todo o nosso modo de viver.
Queridos irmãos e irmãs, peçamos ao Senhor que sustente a nossa fé, 
que nos ajude a encontrar a verdadeira fé e nos dê a força para anunciar
 o Cristo crucificado e ressuscitado e para dar testemunho dele no amor a
 Deus e ao próximo. Deus nos conceda receber o dom da nossa filiação 
para vivermos plenamente a realidade do credo, na entrega confiante ao 
amor do pai e à sua omnipotência misericordiosa, que é omnipotência 
verdadeira e salvadora.
Antes de conceder a bênção:
Dirijo-me aos jovens, aos doentes e aos recém-casados. Amanhã 
celebramos a memória litúrgica de São João Bosco, sacerdote e educador. 
Vejam nele, queridos jovens, um verdadeiro mestre de vida. Queridos 
doentes, aprendam com a experiência espiritual dele a confiar em todas 
as circunstâncias no Cristo crucificado. E vocês, queridos 
recém-casados, recorram à sua intercessão para viver com generoso 
compromisso a sua missão de esposos. Obrigado.
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